Ganda Ordinarice

Desabafo bem intencionado e imagético sobre o Salão Erótico de Lisboa.

domingo, julho 01, 2007

O III SALÃO EM BALANÇO

O III SALÃO EM BALANÇO
(DICKATORIAL, o editorial de Dick Hard)


Cloe de Laure

Mesmo num blogue que faz reportagem de forma descontraída e bem humorada, há lugar para um balanço mais sério. Melhor, impõe-se mesmo um balanço mais sério, sempre na perspectiva de uma crítica construtiva e de oferecer ao visitante do Ganda Ordinarice, pelos nossos olhos, um panorama do que aconteceu no Pavilhão Quatro da FIL.

É aqui que o jornalista profissional tem de esquecer as relações de simpatia que vai desenvolvendo com as pessoas e reportar com a maior objectividade possível aquilo que pensa, por muito errado que esteja.

A primeira questão que se coloca é esta: o III SIEL foi um êxito ou um fracasso?
Logo aqui se nos apresenta o dilema dos vários prismas sob os quais esta questão se põe na mesa.






--- PÚBLICO. Pode-se dizer que os valores obtidos, em termos de visitantes, rondaram o que se pretendia. Terão ficado entre o sucesso claro do primeiro Salão e a quebra do ano passado. Por isso, os visitantes terão andado muito perto dos 35 mil. A previsão foi-nos confirmada pelo organizador Ferran ao princípio da tarde de Domingo.


Quer isto dizer que existe uma consolidação do Salão, em termos de futuro. Se o fluxo do público continua a existir, após três anos, independentemente de tudo o resto, o futuro estará, a priori, assegurado, embora se saiba que tudo depende dos contratos assinados.
Mas a proximidade de Barcelona e a sinergia com a “máquina” do FICEB (Salão de Barcelona) são dois factores que jogam a favor da continuidade do Salão.

E qual é a reacção do PÚBLICO perante o Salão?
Continua muito diversa, como acontece desde 2005.

--- Há quem se estreie como visitante e se deixe deslumbrar com o ‘glamour’ dos corpos nus dentro de um pavilhão de dimensões grandes. Há quem fique mais ou menos neutral. Há quem ache que o Salão não passa de uma versão pindérica de Barcelona.

--- Muito genericamente, os casais de namorados tendem a encarar o Salão como uma oportunidade de fruir de uma experiência diferente. A visita a um local ainda com a marca do “interdito”. Falamos de uma tendência, não de um facto comum a todos os casais de namorados, como é óbvio.

--- Os grupos de amigas encaram o Salão de forma libertina e libertadora. Escondem a hipocrisia da sociedade numa fruição do Salão que passa por muitas gargalhadas e brincadeiras, como forma de esconder o complexo de culpa por quebrar o tabu. Os portugueses ainda têm medo do sexo e continuam a não saber encará-lo de forma natural.

As senhoras, vítimas de uma sociedade que as aponta a dedo, precisam de se sentir protegidas para se libertarem de anos e anos de um reverente receio do prazer, “constitucionalmente consagrado” aos homens.
Prova disso foi a necessidade de envolver com “arame farpado” as simples aulas de “pole dance” (varão) do Círculo de Dança de Lisboa. E as sessões de “Tuppersex”. Coisas mais do que naturais, mas que as senhoras ainda sentem como “perigosas”, com um custo potencial que lhes podem fazer pagar. A presença de homens (visitantes ou Comunicação Social) seria inibidora e foi terminantemente proibida.

Claro que a minha afirmação diz respeito a gerações mais velhas. Os jovens adolescentes de hoje e aqueles que estão na casa dos 20 encaram já todas estas coisas de forma mais natural. Ainda assim, a subida ao palco para uma simples brincadeira com um stripper ainda é motivo de muita reflexão.


--- STANDS. A crise reflecte-se no número de stands presente. Nem todos estão dispostos a apostar no risco, devido aos custos elevados que os stands comportam. Se alguns estão no Salão porque “noblesse oblige” (como acontece com as editoras na Feira do Livro), limitando-se a encarar quebras de negócio como naturais “baixas de combate”, outros equacionam cada vez mais a continuação na área dos expositores.




Quanto maior é a “máquina” que o stand tem (e a sua relação com cadeias de sex-shop já existentes, a ligação a produtoras ou distribuidoras, a sinergia com os grupos internacionais), menores são as dificuldades. Quanto mais pequeno é o stand, mais dificuldade tem em “fazer-se ouvir”. No meio disto tudo, há sempre “nichos” que sobrevivem muito bem e outros que nem compreendem porque ninguém lhes liga nenhuma num espaço privilegiado.


--- ESPECTÁCULOS. Dependem muito dos artistas presentes. E do seu carisma. Os corpos podem ser mais bonitos ou mais feios, mais ou menos voluptuosos, mas o carisma do artista é “quem mais ordena”.


Sonia Baby (Palco IFG) é um exemplo do mais alto profissionalismo e do que deve ser um animal de palco. O sorriso sai-lhe natural. Sente-se o prazer de quem gosta de actuar para uma audiência. E o seu trabalho é dos mais difíceis.

Sonia Baby a dar à luz. O Professor Pardal emprestou o Lampadinha à Sonia Baby e ele foi viajar até ao interior

É preciso muito arrojo e muito treino para se ser “acrobata vaginal”. Embora Sonia já tenha alargado o seu âmbito de actuação ao cinema porno, é nas artes de acrobacia vaginal que marca a diferença, tal como os “Penis Pupeteers”, australianos que passaram pelos palcos de Lisboa.
(Os senhores inventavam mil e uma coisas só com a manipulação do pénis e dos testículos).







Quando uma borboleta rosa se põe a voar no palco, qual abelhinha à procura do pólen dos afectos, é como se o Príncipe do conto de fadas quisesse casar com a borboletinha. Explodem confetti por cima da cabeça e a borboletinha tem muitos filhinhos, que são flores coloridas. E foderam felizes para sempre. Diz-me, espelho meu, há alguém no Salão que tire mais coisas da pachacha do que eu?

O profissionalismo de Sonia passa pela boa disposição constante, pela ausência de sobranceria no tratamento com os seus pares, os jornalistas ou o público. E um respeito altamente louvável pelo cumprimento dos horários. Nos oito espectáculos de Sonia Baby, nenhum ultrapassou os cinco minutos de diferença em relação ao horário previsto (quinta, sexta e sábado, pelas 17 e 22 horas, no domingo pelas 17 e 21 e 20 horas).


Dúnia Montenegro é outro exemplo de como se deve estar num palco. Mesmo assim, há quem seja de um nível de exigência enorme. Uma stripper brasileira que apenas visitou o Salão e não participou considerou todas as participantes do palco IFG do III SIEL como “feias”. Não considerou nenhuma com nota positiva.






--- PROGRAMA E HORÁRIOS. O caos total. De ano para ano as coisas têm vindo a piorar, revelando-se profundamente desmotivadoras a quem aposta na militância (quase) totalmente pura e dura ao serviço do SIEL. Digo ‘quase’ porque neste III SIEL assumi desde o princípio o objectivo egoísta de divulgar os meus livros, porque o jornalismo como freelance se está a revelar um deserto extremamente penoso de atravessar.

Mas é mais do que óbvio de que ano após ano gasto dinheiro como jornalista, gasto como visitante, gasto como amigo.

Paguei a um fotógrafo profissional para cobrir comigo o Salão (e da sua parte também houve um esforço de conciliação com outros trabalhos que tinha agendados) e o nosso labor foi tremendamente dificultado pela ausência pura e simples de um programa com horários das actividades.
Isto é pura e simplesmente inconcebível numa máquina com a dimensão do SIEL.
Se nos anos anteriores os horários eram desrespeitados (nalguns casos por horas), este ano nem sequer havia horários. Os níveis de motivação para quem anda a trabalhar descem para muito próximo do zero.


E só com muito espírito de sacrifício se fica de plantão em várias zonas, na expectativa de que aconteça qualquer coisa. Principalmente depois de uma noite em claro a escrever uma reportagem o mais desenvolvida possível.Apenas pela paixão da escrita e nunca por vaidade de escritor ou necessidade de afirmação. Não é agradável enchermo-nos de cafeína para atingir o “up” e escrever horas a fio e depois tomar “bombas” para dormir e atingir o “down”, para no dia seguinte sermos completamente bombardeados com um ruído verdadeiramente perturbador durante perto de oito ou nove horas de permanência no pavilhão.

Por exemplo, este ano fiz várias tentativas de entrar no show lésbico da Exotic-Angels e fui desistindo, porque não tinha a certeza dos horários e para estar de prevenção num sítio não podia estar noutro.

Assiste-se ao ridículo de vários diários de impacto nacional estarem a divulgar informação contida nos Press-Releases de coisas que pura e simplesmente não existem no Salão, apesar de terem sido divulgadas. Todos os anos isto acontece, mas nesta edição atingiu-se um nível de bradar aos céus.


O restaurante erótico não existiu, a longa-metragem do Estúdio X era um mito (louve-se a disponibilidade de Max Cortes, ensinando como na prevenção rodoviária o abecedário de uma rodagem porno, tendo Monica Vera como exemplo). Eu consegui entrar no Estúdio X no último dia, o meu fotógrafo foi impedido de entrar pelo segurança (que foi correctíssimo, mas não sabia do que se estava a passar).

Resumindo: dentro do estúdio, Max Cortes autorizava a Comunicação Social a tirar fotos. A dez metros, do lado de fora, os seguranças impediam a entrada a profissionais devidamente credenciados e identificados. E mesmo a saída era difícil. Eu e uma menina do gabinete de Imprensa quase tivemos de implorar para poder sair do Estúdio X, quando a sessão estava praticamente acabada.

Tal como no ano passado, ressalve-se o trabalho da assessoria de Imprensa. Se, nos dois primeiros anos, a Deep Step primou pela simpatia e vontade de ajudar, neste ano o mesmo se passou com a Speed Com. Muito principalmente no que toca à flexibilidade de espírito na credenciação de jornalistas. O Ganda Ordinarice, órgão electrónico amador, que funciona com alguns profissionais e muitos amigos, só tem a agradecer as atenções de que foi alvo por parte da Speed Com, em que todos, sem excepção, foram de uma enorme simpatia, sendo os primeiros a sentirem-se frustrados por não poder ajudar mais.

Se o número de credenciados pelo Ganda Ordinarice não fosse alargado, a nossa cobertura teria sido impossível. Porque a colaboração de todos aqueles que se inscreveram como colunistas tem sido imprescindível para que as postagens sobre o Salão continuem a aparecer, dadas as limitações no que toca à tecnologia de que sofrem as principais “pedras” deste blogue.

Houve azares a vários níveis. Desde logo doenças. Que vão desde as crises de diabetes à laringite, passando por ocupações de última hora e problemas pessoais. Passando pelo facto de eu ficar sem máquina fotográfica no penúltimo dia do salão (partiu-se o motor que enrola os rolos da minha Olympus analógica, com 15 anos de bons serviços à nação). Valeu a dobra do António Costa, que foi fotografando o Salão desde a apresentação realizada no Cinema Paraíso, um ponto que Pierre Woodman classificou como muito negativo.


CICCIOLINA. Se o factor Cicciolina foi, sem dúvida, um bom motivo para chamar a atenção do público e da Comunicação Social, apresentou também o carácter perverso de “secar” tudo o que se passou à sua volta, como um eucalipto.
Houve muitas e belíssimas entrevistas com Cicciolina, mas mesmo assim andou-se dez dias a oscilar na idade de Cicciolina (entre 55 e 56). E muito do que se escreveu foi repetido.

Muitos órgãos de Comunicação Social “deram” o Salão numa espécie de “dois-em-um”: reportagem de fundo com a Cicciolina e depois uma série de breves, baseadas em Press-Realeases. Continuou a haver falta de cuidado na legandagem das fotos. A enorme maioria dos participantes aparece anónima. Como se interessasse apenas mostrar que o Salão Erótico é composto de nus desprovidos de um nome, uma personalidade, uma história.


QUANTIDADE DE PRODUTOS. Conhecido articulista do jornalismo português telefonou-me a pedir conselhos sobre um ângulo de escrita do SIEL. O ano passado andou por lá como visitante e considerou o Salão “uma xaropada, não passa de uma sex-shop gigante”.
Pois bem, a sex-shop gigante teve este ano muitos produtos, mas a variedade foi diminuindo. Conforme os contratos assinados pelas sex-shops, assim o que se podia comprar. Claro que muito havia a comprar, mas com a diminuição do número de stands diminuiu também a escolha. Saldos não faltavam, mas nem só de saldos vive o homem.
Por exemplo, os DVD da Private (excelente qualidade) a 5 euros são um maná. Mas quantas novidades foram apresentadas? Pouquíssimas.
Acabado o Salão, um DVD lá comprado por 5 euros aparece numa sex-shop a 25 e na Worten do Colombo a 15.


Roberto Chivas terminava sempre os espectáculos do palco IFG a mandar as pessoas comprar os filmes das estrelas, mas era difícil descobrir esses filmes no meio de escaparates que eram “abastecidos” sem uma ordem específica. Valia a boa vontade no atendimento. Dirigindo-nos a um funcionário, o DVD pretendido lá aparecia.

Noutros casos, era uma pena que não houvesse os DVD. Pierre Woodman e as suas meninas conquistaram corações, mas aos apelativos cartazes não correspondia ainda a edição do DVD em Portugal. Existe ainda uma enorme “décalage” entre Portugal e França, por exemplo.
Mas também é verdade que um amigo me trouxe um DVD da trilogia de “O gladiador” de Amesterdão (há um par de anos) e o DVD chegou mais caro do que se tivesse sido comprado em Portugal.
Já uma encomenda via Net (através de um amigo) da super-produção “Château” chegou numa embalagem muito cuidada, com uma série de miminhos, entre os quais um belo cordão que me serviu para colocar a credencial ao peito, que foi muito cobiçado por toda a gente.


ALDEIA DOS MACACOS. É impressionante como, ano após ano, tipo Volta a Potugal em bicicleta, as pessoas se continuam a acotovelar por um T-shirt ou um boné lançado no espaço, para o meio da multidão.

A malta a fotografar o show lésbico no palco da Melanie Moore. Mesmo em cima do acontecimento. Pagava-se 3 e 4 euros, conforme os dias.

Este ano a Anastasia Mayo e o Roberto Chivas inovaram, no domingo: chegaram a mandar dois vibradores prateados embrulhados num T-shirt preto. A meio da viagem (Hello, Houston!), o vibrador desceu da sua órbitra e o T-shirt caiu em planeta diferente.




OMISSÕES. Coisas que acabei por não reportar, por manifesta falta de tempo, resistência psicológica, desorientação, impedimentos logísticos próprios do Salão e dificuldade de coordenar a equipa do Ganda Ordinarice: os shows lésbicos da Exotic Angels, uma maior atenção às table dance da Passerelle (falo de reportagem, não de fotos), o palco dos strippers sempre muito bem capitaneados pelo Marco, as aulas de varão, o Tuppersex, as opiniões dos portugueses sobre o ciclo de cinema porno português (que tinha sempre uma média de 15/20 pessoas a assistir).


Podem crer que dei o meu melhor e empenhei também os meus amigos. Culpado sou. Fico-lhes devedor.
E o III SIEL vai continuar no Ganda Ordinarice ainda por vários dias. Mas já era tempo de vos proporcionar um balanço.





DICK HARD. A partir de agora, os leitores vão tomar conhecimento com o detective Dick Hard, figura criada para o blogue A Funda São, em que cobri o primeiro SIEL. São 14 contos de um detective estilo Mike Hammer que é um verdadeiro desgraçado. Um exercício de estilo puro, escrito para um blogue, com piscadelas de olho a visitantes habituais desse blogue. Os contos têm dois anos. Chegam agora ao Ganda Ordinarice e espero que vos aqueçam a alma. É muito mais humor que sexo. Uma brincadeira sem pretensões.




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1 Comentários:

  • Às 11:57 da manhã , Anonymous Anónimo disse...

    Dick Hard (com um ar gozão, para Luís Graça) --- Deste um erro ortográfico em ÓRBITA.

    Luís Graça (que já não estava a ver bem Dick Hard) --- A palavra está bem escrita. Sei muito bem que é um substantivo feminino proveniente do latim.

    Dick Hard --- No texto escreveste ÓRBITRA.

    Luís Graça --- Ms tu não sabes que eu estava todo partido, já via as letras a saltar de um lado para o outro. E há mais gralhas, só que são evidentes. Esta é que se podia confundir com ignorância.

    Dick Hard --- Agora desculpa-te.

    Luís Graça --- Se quisesse até te dava a tanga de que ÓRBITRA é um percurso espacial efectuado por um árbitro à volta do Concelho de Arbitragem.

    Dick Hard --- Ah! mais um erro. Em concelho. É com S.

    Luís Graça --- Tu és é parvo. O concelho de Arbitragem situou-se durante muitos anos na junta de freguesia da Praça da Euforia e agora está radicado na Avenida Havana Écubana.

    Dick Hard --- Ficamos por aqui?

    Luís Graça --- Pode ser.

     

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