Pequena Aguarela Draculiana
DEDICADA A BRAM STOKER
COM PARAGEM EM O'NEILL
E APEADEIRO EM MELLO E CASTRO
Esta noite vou dormir comigo
acasulado num caixão
semeado num castelo transilvanês
arrendado por Drácula a láctea virgem doirada
Os meus fantasmas
emigraram com minha ex-mulher
presumo ter vomitado todos num relâmpago
em que o vodka me deu a volta ao fígado
Cortejar uma donzela
é ser corsário dum corpo
é esquartejar na alma
as Caraíbas do mito
Não quero mais
sobro-me em excessos de mim
nas volúpias que ela teceu
em teias de Penélope
Minha Ítaca é agora este caixão
minha música é o ribombar dos lobos sós
a uivar à lua em desgarradas sadias
como quem ganhou Deus ao totoloto
Tinha dentes de fome e crueldade
são como farpas apontadas em alvo às tuas pétalas
disfarçadas de seios com mamilos d'atalaia
em quartos de sentinela cravados no desejo
Por volta da meia-noite
mais morte menos morte
mais jugular menos jugular
mais sangue menos sangue
Por volta da meia-noite
dizia
quando baterem rigorosas doze badaladas em cio
ao soar do gongo nas muralhas da China do meu cérebro
Por volta da meia-noite
ela vai bailar envolta em olheiras de Mirandela
e todos os delfins de Prometeu
vão rodopiar excelsos e sorver o seu suor
Com a língua pendurada nas axilas
vão lamber os sovacos da donzela
cheirar os cabelos que olfactivamente são neutrais
mas revelam ainda restos de Pantene em segunda mão
Esta noite vou dormir comigo
quando o baile findar
por volta do nascer do sol
quando o raio dos raios acordarem com as galinhas
Haverá vampirinhos a adormecer nos túmulos
clautros e criptas alugados a preços de ocasião
dobradiças a ranger mognos que se fecham
vernizes de caixões a estalar
Mas não só, nem por sombras
haverá muito mais e o mais que haverá
ficará dependurado nas janelas como nos estendais
dos filmes de Beatriz Costa e Vasco Santana
Haverá poemas empalados em postes ensebados
mandados vir de propósito
das mais longínquas aldeias de Trás-os-Montes
geminadas com as mais próximas cidades da Roménia
Cluj não é Bucareste
a Serra dos Candeeiros, contudo
tem umas luzinhas que parecem os Cárpatos
quando piscam árvores de Natal a 24
Esta noite vou dormir comigo
a pança cheia de bandulhos ARH+
aquele sabor de hemorragia nasal acidental
aquele muco viscoso da cor do Benfica
Antes de dormir
rezarei orações a Satanás
terei pensamentos piedosos
para Torquemada e seus sequazes
Lá fora a tempestade não amainará
os trovões serão espelhos de nostalgia estereofónica
o céu cortado e recortado em raios e coriscos
coretos e coristas do Parque Mayer
Pode ser que esta noite não durma comigo
acasulado num caixão
semeado num castelo transilvanês
arrendado por Drácula a láctea virgem doirada
Pode ser que os meus fantasmas
não tenham emigrado com minha ex-mulher
ou até que eu nem tenha vomitado todos num relâmpago
por o vodka me ter dado a volta ao fígado
A ser assim
e só Deus e o Demónio sabem como são as coisas
a ser assim
tudo girará à velocidade de um corcel louco por pipocas
E já não dormirei comigo
mas contigo
minha puta em frenesim de luas cheias
minha vaca de Kreutzfeld-Jakobs
É louca a tua carne?
É rouca a tua boca?
É pouca a tua sede?
É tanta a tua fome?
Possui!
Devora!
Chama-me vampiro!
Desflora!
Dick Hard
Um dos vários poemas que acabou excluído do livro 'De boas erecções está o Inferno cheio' por motivos de espaço. Foi publicado no número um do jornal literário "Artes e Artes" e declamado na Casa Fernando Pessoa, num encontro poético luso-espanhol.
COM PARAGEM EM O'NEILL
E APEADEIRO EM MELLO E CASTRO
Esta noite vou dormir comigo
acasulado num caixão
semeado num castelo transilvanês
arrendado por Drácula a láctea virgem doirada
Os meus fantasmas
emigraram com minha ex-mulher
presumo ter vomitado todos num relâmpago
em que o vodka me deu a volta ao fígado
Cortejar uma donzela
é ser corsário dum corpo
é esquartejar na alma
as Caraíbas do mito
Não quero mais
sobro-me em excessos de mim
nas volúpias que ela teceu
em teias de Penélope
Minha Ítaca é agora este caixão
minha música é o ribombar dos lobos sós
a uivar à lua em desgarradas sadias
como quem ganhou Deus ao totoloto
Tinha dentes de fome e crueldade
são como farpas apontadas em alvo às tuas pétalas
disfarçadas de seios com mamilos d'atalaia
em quartos de sentinela cravados no desejo
Por volta da meia-noite
mais morte menos morte
mais jugular menos jugular
mais sangue menos sangue
Por volta da meia-noite
dizia
quando baterem rigorosas doze badaladas em cio
ao soar do gongo nas muralhas da China do meu cérebro
Por volta da meia-noite
ela vai bailar envolta em olheiras de Mirandela
e todos os delfins de Prometeu
vão rodopiar excelsos e sorver o seu suor
Com a língua pendurada nas axilas
vão lamber os sovacos da donzela
cheirar os cabelos que olfactivamente são neutrais
mas revelam ainda restos de Pantene em segunda mão
Esta noite vou dormir comigo
quando o baile findar
por volta do nascer do sol
quando o raio dos raios acordarem com as galinhas
Haverá vampirinhos a adormecer nos túmulos
clautros e criptas alugados a preços de ocasião
dobradiças a ranger mognos que se fecham
vernizes de caixões a estalar
Mas não só, nem por sombras
haverá muito mais e o mais que haverá
ficará dependurado nas janelas como nos estendais
dos filmes de Beatriz Costa e Vasco Santana
Haverá poemas empalados em postes ensebados
mandados vir de propósito
das mais longínquas aldeias de Trás-os-Montes
geminadas com as mais próximas cidades da Roménia
Cluj não é Bucareste
a Serra dos Candeeiros, contudo
tem umas luzinhas que parecem os Cárpatos
quando piscam árvores de Natal a 24
Esta noite vou dormir comigo
a pança cheia de bandulhos ARH+
aquele sabor de hemorragia nasal acidental
aquele muco viscoso da cor do Benfica
Antes de dormir
rezarei orações a Satanás
terei pensamentos piedosos
para Torquemada e seus sequazes
Lá fora a tempestade não amainará
os trovões serão espelhos de nostalgia estereofónica
o céu cortado e recortado em raios e coriscos
coretos e coristas do Parque Mayer
Pode ser que esta noite não durma comigo
acasulado num caixão
semeado num castelo transilvanês
arrendado por Drácula a láctea virgem doirada
Pode ser que os meus fantasmas
não tenham emigrado com minha ex-mulher
ou até que eu nem tenha vomitado todos num relâmpago
por o vodka me ter dado a volta ao fígado
A ser assim
e só Deus e o Demónio sabem como são as coisas
a ser assim
tudo girará à velocidade de um corcel louco por pipocas
E já não dormirei comigo
mas contigo
minha puta em frenesim de luas cheias
minha vaca de Kreutzfeld-Jakobs
É louca a tua carne?
É rouca a tua boca?
É pouca a tua sede?
É tanta a tua fome?
Possui!
Devora!
Chama-me vampiro!
Desflora!
Dick Hard
Um dos vários poemas que acabou excluído do livro 'De boas erecções está o Inferno cheio' por motivos de espaço. Foi publicado no número um do jornal literário "Artes e Artes" e declamado na Casa Fernando Pessoa, num encontro poético luso-espanhol.
0 Comentários:
Enviar um comentário
Subscrever Enviar feedback [Atom]
<< Página inicial