Ganda Ordinarice

Desabafo bem intencionado e imagético sobre o Salão Erótico de Lisboa.

domingo, junho 17, 2007

As Limitações da Virilidade

Compreender as limitações da própria virilidade é uma prova de virilidade e inteligência. Não há maior demonstração de amor do que ajudar a namorada a comprar um vibrador. Desde que não se torne um vício, claro. Não se trata de assumir a impotência, longe disso. Apenas de compreender que o vibrador é um autêntico coelhinho da Duracell, incapaz de perder a erecção, tratar mal as senhoras ou fugir com a secretária. O vibrador é reconhecidamente o melhor amigo da mulher. Por isso, qualquer homem que seja perspicaz torna-se aliado do vibrador e coloca-se no segundo lugar, que dá ainda acesso à primeira fila da grelha. Não um falso aliado, tipo Shumacher, pronto a abalroar o vibrador ao primeiro ataque de mau génio; mas sim um aliado efectivo e dedicado, admirador das verdadeiras qualidades do vibrador. E muitas são elas: consolo físico e psicológico, resistência, erecção perpétua, durabilidade, tamanho, espessura, design gráfico atraente.



Foi numa tarde de Maio, o céu de chumbo a prometer trovoada de Vulcano, tempo abafado, que me iniciei nas lides de comprador de vibradores.
A minha namorada chamava-se Ilse. Dinamarquesa de Copenhaga, companheira ideal das Carlsberg, garrafas de tara perdida, que se encontravam com a tara de Ilse: enfiá-las na sua grutazinha nórdica e apetitosa. Não achei lá muito ético utilizar garrafas de cerveja para a masturbação. A cerveja tem uma dignidade que se perde no acto. Além do mais, sempre que bebia uma Carlsberg em casa dela era assaltado pela dúvida mais cartesiana do Mundo:onde é que isto já andou ?

Depois de muito remoer ideias e ruminar traumas antigos, sugeri à Ilse uma pequena visita à sex-shop, como quem vai à retrosaria. E pedi de pronto à empregada de balcão, que ganhava o pão a recibos verdes:
--- Ora então, diga-me lá: o que há por aí de vibradores ?



Foi como se S.Pedro tivesse carregado num botão secreto: nos dez minutos seguintes choveram vibradores de todos os tamanhos, feitios, cores, raças, credos e convicções políticas, ecológicas, sociais e desportivas. Em poucas palavras: não faltavam adereços para introduizir o assunto na Ilse.
Decidiu-se por um "Bloody Macho" de 25 centímetros de comprimento por 4 de diâmetro. "Uma obra mestra,porque imita perfeitamente as protuberantes veias de um macho humano. Marcadamente eficaz para descobrir um tesouro de satisfação, regulador de intensidade variável". Há textos muito bonitos. Principalmente no pormenor das protuberantes veias de um macho humano, sem esquecer que o burro macho também revela protuberantes veias de fazer perder a cabeça a qualquer mulher destemida ou protagonista heróica de filmes porno com animais.

Não resisti a assistir a algumas pequenas sessões da Ilse com o seu vibrador de estimação. Experiência curiosa, no mínimo. A conquista das nórdicas pelo afecto fálico do latex supremamente rígido.
Perdi a Ilse num Verão inter-railíco de linhas trocadas, algures para as bandas de Roma. Deve ter cambiado o vibrador pelas itálicas capacidades de um spaghetti qualquer.

Com a Françoise o caso foi diferente. Para já, tinha o mesmo nome da namorada do Michel Vaillant. A Françoise não apresentava a tendência de meter coisas pelo túnel adentro. Quer dizer, também não era exactamente isso. Ou melhor, ela gostava de sexo anal e sentia a falta de qualquer coisa que lhe invadisse o principal túnel do prazer. Antes que procurasse convencer-me em passar o duo para trio, resolvi comprar-lhe um vibrador, ficando eu como fiel depositário do simpático e cooperante artefacto.
A Françoise, apesar de gemer em braille e ter orgasmos em dolby stereo, era uma rapariguinha de trato fácil e vergonha garantida.Andámos que tempos na Baixa Pombalina, a fugir das obras e a "equipá-la" para a visita à "sex-shop". Primeiro foi escolher óculos escuros espelhados, não muito espalhafatosos. Só aí gastámos uma hora. Depois insistiu em comprar um blusão de cabedal preto, gola alta. O quadro completou-se com uma bóina de lã preta, tipo basco. Parecia uma Mata-Hari no Inverno de Moscovo.



Lá fomos nós à cata de vibradores. Eu já tinha feito uma prospecção de mercado e dei-lhe a escolher entre o "Vibrasoft Abdul" ("um dos modelos favoritos da nova geração de vibradores com textura gelatinosa, tão ricos e deliciosos em sensações como a pele de um incansável amante") e o "Gold Lady" , um vibrador com cara de quem vai protagonizar o próximo filme de James Bond, com patrocínio da John Player. Preto e ouro, o "Gold Lady" tem "uma forma anatómica que se complementa com uma
ponta fina altamente sensível. Extrafino, um elemento de delicioso prazer". São 17 centímetros de comprimento por 2,5 de diâmetro.
A Françoise caiu por este e não se pode dizer que tenha escolhido mal. Passámos bons tempos, numa espécie de Trio Odemira luso-francês. Voltou para Paris ao abrigo de um acordo qualquer de cooperação bi-lateral. Adivinhem qual foi o meu presente de despedida. Ainda me lembro da cena triste em Santa Apolónia. Eu a dizer adeus com um lenço imaculadamente branco, ela a afastar-se no "cavalo-de-ferro", a piscar-me o olho e a dar beijinhos no vibrador, cuidadosamente embrulhado num cachecol de padrão escocês.

Com a Pernilla não havia nada a fazer. Queria um vibrador novo todas as semanas. Pagávamos a meias, mas só ela é que os gozava com toda a propriedade. Não sei se é a isto que chamam a ginástica sueca.O seu grande amor foi o "Super Long Finger" , um bicharoco de 22,5 centímetros por 2,5 de diâmetro. Um "gelatinoso negro muito estilizado. Penetra sem esforço nas mais escondidas profundidades. É muito apropriado também para incursões anais". Um dia passou no Rossio e deu três vibradores velhos a um malabarista, que lhes tomou o peso e agradeceu a dádiva, farto das maças ortodoxas.
A Pernilla era deliciosamente sardenta. Tinha uma grande audácia e um pequeno par de seios. Cabelos longos e ideias estapafúrdias. Não sei bem como, alinhei numa série delas, como enfiar-lhe um "Bravíssimo" ("justificadamente, é um clássico da vibração multissexo") em pleno teleférico do Jardim Zoológico, mesmo por cima da jaula dos leões. Eles a rugir lá em baixo, ela a gemer lá em cima, eu a babar-me para cima de um leão imóvel de matriz alentejana. Acho que ela teve um orgasmo por cima das impalas. Má fortuna, escorregou-nos o "Bravíssimo" das mãos por cima da aldeia dos macacos. Ignoro o uso que lhe deram, mas as pilhas não deviam durar muito mais, senão era o fim da macacada.



Um dia desapareceu sem grandes despedidas. Apenas um recado na agenda doméstica da cozinha: "Ciao, baby. Se fores a Gotemburgo, telefona". Escusado será dizer que aquela cabecinha tonta se esqueceu de me dar o número de telefone. Bah! Que se lixe ! Tenho a morada de casa. Posso sempre aparecer-lhe de surpresa com um ramo de rosas numa mão e um "Long Finger" na outra ("é um gentleman. Penetra sabiamente nas profundezas onde reside o maior dos prazeres. Muito apropriado, também, para incursões anais. Suave, flexível, terno").

As minhas melhores memórias vibratórias ocorreram com a Fábia, uma italiana de Riccione, ali a dois passinhos de Rimini. Sabia quase tudo de vibradores. Começara muito cedo na actividade. Limitei-me a aprender o que pude. E não foi pouco. A Fábia dava-se ao trabalho de questionar intensamente os empregados da "sex-shop" antes de comprar. Se o funcionário ou funcionária dava mostras de um mínimo de ignorância, a Fábia começava a ficar vermelha e a tratá-los com maus modos.
"Os vibradores são uma coisa muito séria. Não suporto incompetentes. Porca Madonna!" --- dizia ela, com um ar muito sério.
A Fábia emigrou para a Austrália. Nunca mais a vi. Hoje tenho brincado pouco com vibradores. Sei lá, acho que perdi um bocado da vontade. Eu que até era danado para a brincadeira...

FIM

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